05 maio 2009

publicado por Miguel Portas, em sem muros


Financiamento dos partidos, uma história mal contada




O que saiu cá para fora, com a chancela, entre outros, de Marcelo Rebelo de Sousa, foi que os partidos decidiram fazer “regressar as malas de dinheiro vivo”. Verdade?Comecemos pelo óbvio: será que os partidos são suficientemente loucos para se meterem nessa quando têm 3 eleições à porta? Será que o faria o bloco, uma força que tem direccionado grande parte da sua actividade política para o combate à corrupção? Não parece razoável, pois não?Então o que se passa na realidade?

1. Há uns anos o parlamento acabou com o “dinheiro vivo” e instaurou o critério do financiamento público dos partidos. O financiamento por empresas foi proibido - e bem; o financiamento por particulares passou a ter que ser feito por movimento bancário e foi limitado a 25 salários mínimos - muito bem. Ambas as medidas se mantêm. Não há qualquer alteração neste domínio, salvo a conversão de salários mínimos em IAS (o indexante de apoio social), o que não altera substancialmente, nem o montante (pelo contrário, baixa-o), nem os critérios.

2. Então porquê o “bruá”? Porque a lei alarga substancialmente o limite para as entradas de “dinheiro vivo” em iniciativas e realizações partidárias, estritamente contra a venda de bens e serviços e até 100 euros por pessoa. Aplica-se um critério similar ao do pagamento de quotas em dinheiro - até 1 IAS.Errado? Certo. Os partidos de esquerda nunca defenderam o financiamento exclusivo dos partidos pelo Estado porque isso os “funcionaliza”. Sempre defenderam - e bem - que um partido deve realizar iniciativas e promover a recolha de fundos entre os cidadãos - porque disso também vive a democracia.Uma pessoa vai à festa do Avante! e tem que pagar a sua cervejola com cartão? Tenham juízo os “anti-corruptores”. O bloco organiza um jantar com dois preços - um a 10 euros, outro a 20, de apoio - e todos os convivas têm que pagar de cartão bancário a sua inscrição na mesa dos pagamentos? Por favor…

3. Muito bem, mas à pála das pequenas contribuições não se está a abrir uma “caixa de pandora”? Não, não está. As condições em que este “dinheiro vivo” pode entrar são claras e não vagas. Por outro lado, isto não dispensa os partidos de apresentarem contas das despesas e receitas das iniciativas e a “recolha de fundos com bandeira” continua a ser interdita (não ha contribuições anónimas sem contrapartida em bens e serviços documentados).

4. Não me passa pela cabeça penalizar as forças de esquerda pelas qualidades que têm - de motivação para uma cidadania activa - em nome dos perigos de corrupção nos partidos centrais. Hoje, a fiscalização dos partidos é muito mais severa - e ainda bem. Isso limita a corrupção em favor dos partidos, embora não evite a corrupção dirigida aos seus dirigentes ou autarcas ou, ou… mas isso não é a lei do financiamento dos partidos que resolve, mas o levantamento dos segredo bancário, o registo dos movimentos de capitais e o fim dos paraísos fiscais.

5. Finalmente, a nova lei resolve dois problemas que a anterior criara: as segundas voltas das presidenciais não tinham mecanismo de financiamento previsto; as listas de cidadãos, idem idem, o que as coloca numa posição de concorrência agravada face às listas partidárias (Helena Roseta que o diga…)

Não é a minha lei - porque continua a manter escandalosamente altos os montantes máximos que os partidos podem apresentar nas disputas eleitorais - mas é uma lei que põe fim a uma discriminação indecente e que valoriza a participação dos cidadãos “de baixo” na vida política.

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